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segunda-feira, 23 de maio de 2011

PL 122/06

Fiquei muito feliz quando soube, há alguns dias, da aprovação da união homoafetiva no Brasil por unânimidade pelos ministros do STF, e ainda que tenha me trazido aquele sentimento que é por vezes tão estranho de pleno orgulho nacionalista, ainda me incomoda o fato de que em pleno 2011 essas questões aindas sejam a causa de debates tão fervorosos, como se houvesse uma resistência, que beira um nível biológico, de algumas parcelas da sociedade para abarcar certos valores que me parecem, a primeira vista, um caso de puro bom-senso.

Não é nenhuma novidade o fato de que o homossexualismo é um dos principais alvos de preconceitos, não só no Brasil mas no mundo como um todo, e por isso há mais de 30 anos a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), com o apoio de diversas organizações afiliadas de todos os cantos do país, desenvolveram o Projeto de Lei 5003/2001, que futuramente ficou conhecido como projeto de Lei da Câmara (PLC) 122/2006 que tem como efeito principal a criminalização da homofobia.

Caso venha a ser aprovado, o projeto de lei alterará a Lei nº 7716 de 5 de janeiro 1989, passando a vigorar a seguinte redação:

Art. 1- "Serão punidos, na forma desta lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, procedência nacional, gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero."

Dessa maneira o PL 122/06 não passa de uma ampliação natural de uma lei de proteção dos cidadãos, estando em favor da luta antidiscriminatória e de acordo com as as diretrizes traçadas pelas Cortes Internacionais de Direitos Humanos, que são devidamente reconhecidas pelo Brasil.

Tendo isso em mente, recebi um e-mail na semana passada, cujo parágrafo inicial já dita o consteúdo insensato da mensagem integral:

"Está para ser aprovado pelo Congresso Nacional Brasileiro uma Léi inédita no Mundo, algo que destruirá a Constituição Brasileira e fará ressurgir no Brasil algo pior que a ditadura militar do Brasil, falo do PL 122, uma lei que impedirá o direito de expressão e reprimirá e punirá aqueles que são Cristão (sic)"

O texto do projeto de lei aborda diferentes formas de manifestações que podem constituir homofobia, e para cada crime há uma pena proporcial a ser aplicada e que atinge, no máximo, 5 anos de reclusão.

Entre as razões que apontam para a necessidade dessa lei me dou à liberdade de citar aquelas que me parecem as razões mais urgentes. Em primeiro lugar não há em nossa legislação proteção específica para casos de discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, isso significa que aproximadamente 18 milhões de pessoas continuam a sofrer discriminação na seleção para emprego, no próprio local de trabalho e na escola, não possuindo suporte legal para abertura de processo judicial, isso sem mencionar os casos mais extremos de agressão verbal , violência física e assassinatos que são tratados sem distinção dos crimes de outra natureza.

Os crimes de ódio (ou crimes motivados pelo preconceito) são considerados como tal quando o criminoso seleciona as suas vítimas em função de pertencerem a um determinado grupo. O grupo em questão se define em diversas categorias: raça, religião, espécie, deficiência, etnia, nacionalidade, idade, orientação sexual, gênero ou identidade sexual.

O Brasil infelizmente não detém estatísticas sobre crimes de ódio, mas segundo o Grupo Gay da Bahia no ano 2000 foram assassinados 130 homossexuais em função de sua orientação sexual, enquanto nos Estados Unidos constam 100 assassinatos, lembrado que a população norte-americana é de cerca de 250 milhões (80 milhões a mais do que o Brasil).

Ou seja, o Brasil é lider em crimes contra homossexuais.

Crimes de ódio no Brasil dão enfoque ao racismo e no preconceito racial, como assassinatos praticados por grupos de morte e esquadrões de extermínio e o genocídio, em função de religião, etnia, raça ou nacionalidade, esse tipo de crime recai em uma categoria processual diferente, pois o crime não é cometido apenas em relação a um indivíduo, mas em relação a uma comunidade. No caso da homofobia, o PL 122/06 propõe a equiparação dos crimes por preconceito de orientação sexual e identidade de gênero aos demais preconceitos que já são objetos da Lei 7716/89.

Mais além, a "mordaça gay", como alguns setores conservadores da sociedade brasileira têm se referido ao PL 122/06, não limita ou atenta contra a liberdade de expressão, de opinião, de credo ou de pensamento, ao contrário, o projeto contribui para sua garantia ao evitar que parte significativa da população, hoje discriminada, seja agredida ou preterida exatamente por fazer uso de tais liberdades em consonância com sua orientação sexual e identidade de gênero.

Muitos setores religiosos fundamentalistas brasileiros, em especial católicos e evangélicos, tem se utilizado da liberdade de expressão como escudo para refutar o projeto de lei, no entanto se esquecendo que a liberdade de expressão não é absoluta, como o que já acontece no caso do racismo, discursos preconceituosos e outras condutais ilícitas que não estão protegidos sob o escuto da liberdade de expressão, estando sujeitos aos devidos processos judiciais e consequências penais; caso se substitua a expressão cidadão homossexual por cidadão negro, ou cidadão judeu no projeto, é fácil ver que a lei em nada difere do que já é atualmente praticado.

Sendo a liberdade religiosa devidamente protegida e o Estado brasileiro laico, é consequência natural que o PL122/06 não restrinja a liberdade de culto ou pregação religiosa, o que está previsto é o impedimento de manifestações de incitação discriminatória, difamação, ofensivas ou de desprezo, particularmente aquelas que incitem a violência. Dessa maneira as religiões são livros para pregar sua visão teológica (quanto ao pecado, que seja), mas não podem promover inverdades científicas e estigmatizar segmentos da população sob o manto de liberdade religiosa.

Recentemente o texto original do projeto foi alterado pela senadora Marta Suplicy para incluir um parágrafo que explicitamente protege os templos religiosos da lei, mostrando novamente que a lei em nada interferirá com a liberdade de culto e de fé, contanto que não se utilizem do escudo religioso para incitar a violência.

Sendo o Estado laico, quaisquer argumentos religiosos em nada devem interferir na tramitação do projeto de lei pelo congresso, e as considerações devem de manter dentro de estâncias reconhecidas socialmente, e não sendo o homossexualismo um crime, uma doença (segundo a OMS), estando consolidado em várias áreas do saber humano, principalmente psicologia, sociologia, estudos culturais, é um fato social que não pode ser desconsiderado ou tratado com leveza, devendo estar abrigado sob forma da lei.

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Para quem não teve a oportunidade, aqui está o Projeto de Lei 122/2006 na íntegra.

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Louis C.K. resumiu de maneira muito precisa a ópera dos direitos dos homossexuais em um de seus stand-ups:

Lawyer for the gay side: Well your honor, we pay taxes, there's nothing illegal about what we do, we're the same as anyone else, why shouldn't we get the same protection under the law as heterosexuals do?

Lawyer against the gay side: Your Honor... They're fucking queer! THEY'RE FUCKING QUEER!

Judge: O.K. Councelor, but I don't see what that...

Lawyer against the gay side: What? Are you a fucking faggot? Your Honor you're going to get fucking beaten! FAGGOT!

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